Em
De Anima, Aristóteles mostra
claramente o que é a alma e de modo primário demonstra sua funcionalidade.
Segundo o filósofo, as plantas, os animais e os homens possuem alma. Ela seria
o princípio ativo do movimento e da essência, em sua razão. A essência da alma
na planta é conferir-lhes o movimento para a nutrição; a alma animal denota em
sua essência o movimento para a nutrição e reprodução, enquanto a alma humana
carrega em sua essência o movimento para a nutrição, reprodução e a razão com
todas as suas faculdades.
Em
seu artigo Três Ensaios para a Teoria da
Sexualidade, Freud aprimora o pensamento, até certo ponto, do filósofo
Aristóteles, ao equiparar a funcionalidade de energias que envolvem a persona humana
com a de animais. Um ponto relevante a ser discutido é sobre as necessidades
sexuais encontradas em homens e animais. Destas necessidades, o mestre de Viena
expõe o equívoco das ciências vigentes que negaram a existência das
necessidades sexuais na infância. Esta energia foi chamada de pulsão sexual,
libido. Ela projeta no homem características importantes que influenciam o
desenvolvimento da personalidade. Freud desenvolve, então, a teoria da
sexualidade para compreender cientificamente o processo psíquico da formação
contínua da personalidade, e ele se vale da pulsão sexual existente no homem
para provocar a ciência a descobrir outras verdades.
Refletindo
sobre a homossexualidade, inversão.
Compreendido
o conceito de pulsão sexual, que é a energia voltada para as necessidades
sexuais, faz-se necessário entender como ele flui, age. O objeto sexual será
considerado o outro de onde provém a atração sexual, enquanto o alvo sexual é a
ação que é impelida pela libido.
Na
obra O Banquete, de Platão, temos a
condição aceita e mítica do que seja o amor: a união com sua outra metade. De
algum modo, homem e mulher se completam. É por meio do amor e do sexo que
existe a perfeição do encontro entre um e outro. Grande espanto é quando um
homem deseja unir-se a outro, ou uma mulher deseja unir-se a outra. Tais
pessoas eram conhecidas como ‘invertidas’.
No
processo de inversão, as pessoas podem se comportam de maneiras diferentes,
podendo ser:
Invertidas absolutas: quando
o objeto sexual é exclusivamente do mesmo sexo;
Invertidas anfígenas:
quando o objeto sexual pode ser do outro sexo;
Invertidas ocasionais: aquelas
que por inacessibilidade e/ou imitação do objeto sexual diferente do mesmo
sexo, pode chegar ao prazer no ato sexual com pessoa do mesmo sexo.
A aceitação da inversão por parte do
próprio invertido pode ser algo natural ou não. Freud diz que os casos extremos
de inversão podem ser considerados com existência prematura e que a pessoa
sente-se com consonância com sua particularidade. Ainda, da origem, pode ser
dito que equivocadamente dizia-se que a inversão advinha da degeneração
nervosa, mas há claras evidências que negam o fato. Primeiramente, a
degeneração foi erroneamente aplicada para casos em que não se tinham
conhecimento adequado do termo. Ademais, encontra-se inversão em pessoas que
não tem degeneração nervosa. A inversão pode ser encontrada em pessoas de
elevado grau e notoriedade intelectual e ética. É preciso considerar ainda que
a inversão foi encontrada em civilizações antigas, tendo seu papel de extrema
importância.
Pensavam, equivocadamente sobre o
caráter inato ou adquirido da inversão. Tais ideias mostram-se frágeis para
explicar a realidade, dada à observação de casos em que os invertidos absolutos
não são totalidades. Como o caráter inato
não abarca a totalidade surge a ideia de adquirir a inversão. De imediato, a
ideia cai por terra, pois pessoas podem receber estímulos externos como a
sedução, a masturbação mútua e mesmo assim não se tornarem invertidas.
Já que o caráter inato ou adquirido
não pode explicar com eficácia e realidade a origem da inversão, outro recurso
pode ser lançado para melhor compreensão. Existem pessoas que combinam
caracteres sexuais masculino e feminino ao mesmo tempo, os hermafroditas. Em casos raros coexistem os dois caracteres
desenvolvidos plenamente. A maior parte dos hermafroditas vai atrofiando um ou
outro órgão. Levando para o entendimento psíquico e mental, fica mais fácil
compreender a etiologia da inversão. O homem é bissexual, mas no decorrer de seu
desenvolvimento vai optando, talvez, para a monossexualidade. Deste modo, ele é
um ser de possibilidades.
A bissexualidade também, não é
totalmente uma etiologia satisfatória para explicar a gênese da inversão,
contudo, ela está atrelada a tal processo.
A teoria do hermafroditismo psíquico
pressupõe que o objeto sexual do invertido seja do sexo oposto do normal. E
algo há ser refletido é que no hermafroditismo psíquico o homem sente atração
por outro, desde o seu objeto sexual reunisse características do sexo feminino,
enquanto que a mulher invertida ativa espera feminilidade de seu objeto sexual.
Havia um entendimento universal da
dependência e continuação entre a pulsão sexual e o objeto sexual. Freud mostra
a partir de seus estudos que essa dependência e continuação são quase
inexistentes, podendo até a pulsão sexual e a libido serem independentes.
Da
pedofilia e zoofilia
Freud
ensina que a pulsão sexual necessita ser saciada. Quando esta se movimenta em
busca de seu objeto sexual, ela precisa ser satisfeita e seu alvo sexual quase
nunca, exceto em casos extremos, pode sofrer alterações. Para o homem que se
satisfaz com uma criança ou animais, pode ser afirmado que ele está
substituindo seu objeto sexual por inadequação do seu original. Poder-se-ia
afirmar também, que tais desvios e pulsão sexual não pertenceriam à loucura,
pois não são perceptíveis em pessoas com transtornos ou doenças mentais. Das
pessoas que abusam de crianças, por exemplo, fazem parte aquelas que são mais
próximas delas.
Há de se pensar ainda, que pessoas
com alguma anormalidade social e/ou ética, também assim se manifestará em sua
vida sexual. Contudo, é notório que muitos que mantém uma vida sexual anormal
encontram-se dentre as numerosas pessoas que demonstram uma normalidade social
e ética.
Desvios
do alvo sexual:
transgressões anatômicas e fixações de alvo sexuais
provisórios
Alvo
sexual normal é considerado a genitália masculina e feminina durante o coito.
Elas, a genitálias, unem-se para satisfazer a pulsão sexual e saciar a fome que
dela brota. Contudo, mesmo dentro do alvo sexual normal pode-se constatar a
presença de aberrações chamadas de perversões. Elas podem ser transgressões
anatômicas, quando as partes do corpo destinadas à união sexual sejam outras
que não as genitálias masculina e feminina, e demoras ou fixações em regiões
que servem apenas para estimular o prazer antes de chegar ao contato final das
genitálias.
A
libido do homem no curso do alvo sexual depara-se com a supervalorização do seu
objeto sexual. Antes do ato sexual, que irá saciar a ‘fome’ da energia sexual,
os desejos do homem voltam-se para o corpo do seu objeto sexual, espalhando-se
por completo. Em raros casos, essa supervalorização concentra-se primariamente
na genitália. O amor então passa a ser fonte de verdade e credulidade no amado
e no amante.
Quanto
à boca e sua forma de alvo sexual, a normalidade reside quando esta se encontra
com outra, e a anormalidade ou perversão será quando ela se uniu a genitália do
outro. Algumas pessoas irá entender que esta perversão não pode ser realizada
pelo asco que dela recorre. Tal asco decorre de mera convenção social, e ele impele
a supervalorização do objeto sexual. O asco contém em si a restrição ao alvo
sexual. Pode-se constatar que os histéricos, especialmente as mulheres,
demonstram asco à genitália de seu objeto sexual.
Em
se tratando do orifício anal, a perversão será quando a repugnância estiver
presente no alvo sexual. É de se entender que o ato sexual anal não é restrito
apenas aos invertidos, nem que ele seja sensível apenas aos mesmos.
O
alvo sexual nada mais quer que apoderar-se do seu objeto sexual. A supervalorização
sexual apresenta-se nas transgressões anatômicas a reivindicação enquanto parte
genital, ou seja, as mucosas bucal e anal tentam comparar-se à genitália.
Fetichismo
Quando
o objeto sexual é substituído por outro que guarda certa relação com ele, mas
que é impróprio para o alvo sexual normal, acontece o fetichismo. Em geral, o
substituto do objeto sexual é uma parte do corpo ou um objeto inanimado. Para
que o fetiche seja patológico é necessário que ele se fixe e se coloque no
lugar permanente do objeto sexual normal. A escolha do fetiche é determinada,
quase sempre, de uma impressão sexual recebida na primeira infância. Em outros
casos, a substituição do objeto sexual normal pelo fetiche é algo simbólico e
de pensamento, que não são conscientes.
Alvos
sexuais provisórios: fixações
Tudo
que venha a dificultar ou adiar o alvo sexual normal reforça a tendência em
demorar nos atos preliminares e assim a formar novos alvos sexuais que podem
substituir o normal.
O tatear e tocar a pele
do objeto sexual faz parte do ritual de saciedade da pulsão sexual. Demorar-se
no ato do tocar, desde que o ato sexual seja concluído, não figura entre as
perversões.
O olhar que derivar do
tocar desperta sensação libidinosa. A ocultação do corpo, culturalmente
progressiva, desperta a curiosidade sexual que ambiciona completar o objeto
sexual através de revelação das partes ocultadas. Isso não constitui um estado
patológico. Contudo, quando o prazer em ver restringe-se exclusivamente à
genitália, ou quando se liga à superação do asco, ou quando se substitui o alvo
sexual normal em vez de ele próprio ser preparatório, pode-se inferir caso
patológico.
Sadismo e masoquismo
Da existência do prazer
na humilhação ou sujeição teremos o sadismo, a forma ativa, e masoquismo, forma
passiva.
Biologicamente, o homem
não corteja seu objeto sexual. Ele, ao contrário, tenta vencer seu objeto
sexual pela agressão e tendência a subjulgar. De tal modo, a etiologia do
sadismo reside na agressão exagerada da pulsão sexual canalizada para o lugar
preponderante, ou seja, seu objeto sexual. De todas as formas o homem é sádico
e o que o definirá como perverso será a sua exclusividade em atos sádicos.
O masoquismo é a forma
passiva do prazer em ser subjulgado, humilhado. Não deixa de ser sadismo, pois
é a continuação do mesmo que se volta contra a própria pessoa.
A dor contém em si a
possibilidade do prazer. Isso torna o sadismo e masoquismo um jogo, o qual
permite que a pessoa seja ao mesmo tempo sádica e masoquista.
Perversões:
considerações, variação e doença
Amplamente fora
discutido sobre a condição sine qua non da
perversão como doença degeneração ou doença. Esta hipótese pode ser descartada.
Há um número elevado de pessoas com alvos sexuais normais que em um momento ou
outro apresentam alvos sexuais pervertidos e substituídos. As transgressões
anatômicas mostram que em circunstâncias favoráveis sempre serão adotadas como
alvo sexual.
Há de convir que
algumas perversões não deixam de ser patológicas (lamber excrementos, abusar de
cadáveres e outras), e mesmo assim as pessoas podem e devem ser consideradas
normais. Sua vida sexual que deverá ser considerada anormal, já que a
anormalidade se manifesta somente neste campo. O que é considerado patológico é
o caráter exclusivo e fixador da perversão.
Sobre as perversões
fica claro que a pulsão sexual terá de travar luta com as resistências (asco,
vergonha e dor). Tais resistências anímicas colocam o alvo sexual dentro do
limite da normalidade.
A pulsão sexual nos
neuróticos
A energia da pulsão
sexual é a força primária e motriz das neuroses. Sintomas são atividades sexuais
dos doentes. Eles constituem uma substituição de desejos e aspirações
investidos de afeto. Por meio do recalcamento, a pulsão sexual é negada a
chegar à sua plenitude. Esse processo inconsciente aspira a uma expressão
apropriada de seu valor afetivo, ou seja, acontece uma conversão em fenômenos
somáticos.
Os sintomas extraem
força da pulsão sexual para somatizar. O caráter neurótico intensifica a
resistência à pulsão sexual utilizando-se da vergonha, do asco e moralidade.
Entre a urgência da pulsão sexual e a resistência ao que for sexual encontra-se
a doença.
A psicanálise demonstra
que por meio da sexualidade coexistem os sintomas psiconeuróticos. Deste modo,
é por causa da negação da perversão que se instaura os sintomas. Caso as
pulsões se expressem diretamente com propósitos de fantasias e em ações, não
haveria as neuroses.
Sendo a neurose o
negativo da perversão, pode-se constatar o quadro patológico nos neuróticos a
partir de fatos como a existência de moções de inversão negadas em todos os
neuróticos; as transgressões anatômicas reivindicam inconscientemente as
mucosas da boca e ânus como genitália e assim eles geram sintomas; e novos
alvos sexuais, como a pulsão do prazer em ver e do exibicionismo e a pulsão do
sadismo e masoquismo, interferindo na conduta social do doente, fazendo a
transformação de moções afetuosas em hostis, amor em ódio e assim por diante.
Diêgo Santana